A Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo vai promover uma série de debates para preparar um Encontro, a promover em Maio, sobre o tema Autonomia das Escolas. Convidou-me a Direcção da AEEP para o primeiro evento, realizado em Serralves, no passado dia 17 de Fevereiro. O texto que segue serviu-me para introduzir o debate, naquela sessão.
O que pode um não especialista de Educação contribuir para o debate que pretendem? Foi a pergunta que me assaltou quando pensei melhor na responsabilidade de aqui estar hoje, que assumi com gosto, devo dizer.
Vi, ao ler um texto escrito pelo Senhor Presidente da AEEP, em 13 de Outubro de 2008, sobre o assunto “Autonomia pedagógica do Ensino Privado”, que podem existir entendimentos variados da palavra autonomia, alguns dos quais geram perplexidade e são fonte de preocupação.
Sabemos todos que dispomos de um enquadramento novo para a autonomia, a gestão e a administração dos estabelecimentos públicos e que estamos em fase muito activa da sua aplicação.
Pareceu-me, ainda, que o contexto que se vive justifica alguma reflexão e debate sobre a ideia de autonomia e os seus usos.
Decidi, assim, propor alguma reflexão em torno de três perguntas, alimentadas pelo pensamento de um especialista, o Professor João Formosinho, e por informações recolhidas num relatório de um estudo sobre a autonomia das escolas feito recentemente em 30 países europeus.
A escolha e a estrutura da minha introdução ao debate alimentam-se, naturalmente, da minha experiência de professor universitário, cidadão com um certo envolvimento e responsabilidade em missões na esfera da Educação, nos últimos anos.
Vamos então às primeiras perguntas: O que é “autonomia da escola”? O que é que a justifica? Para que deve servir?
São perguntas banais, primárias, reconheço. Mas um professor de química gosta de compreender a estrutura da matéria, para perceber as suas transformações e as propriedades dos produtos dessas transformações.
Comecemos, então pela primeira pergunta: o que significa autonomia da escola?
O Professor João Formosinho, em livro de 2005, diz o seguinte:
A advocacia da autonomia da escola emerge no último quartel do século XX como consequência natural do questionamento da centralização e das lógicas burocráticas na administração do sistema educativo.
Podemos, com esta ajuda, entender que a autonomia da escola pode ser entendida como descentralização e libertação das “lógicas burocráticas”. Estamos a falar de autonomia administrativa, ou de gestão.
É este o sentido assumido também numa interessante publicação do Gabinete de Estudos da Educação, de 2007, em que se apresenta o resultado de um estudo comparativo da Autonomia das Escolas na Europa. Políticas e Medidas, realizado pela Rede Eurydice a pedido da Unidade Portuguesa e envolvendo 30 países.
Aí se diz que o conceito de “autonomia das escolas”se refere aos vários e diferentes aspectos da gestão escolar (essencialmente, financiamento e recursos humanos).
Diz-se, ainda, naquele documento que são consideradas totalmente autónomas, ou detentoras de um alto grau de autonomia, se forem inteiramente responsáveis pelas suas decisões dentro dos limites previstos na lei ou do quadro normativo geral relativo à educação.
A autonomia da escola é, enfim, atribuir a responsabilidade por fazer cumprir os fins da escola, a defesa do interesse público, àqueles que estão próximos e directamente envolvidos.
Estas referências seriam suficientes, a meu ver, para iniciarmos o debate, desde que aplicássemos estes princípios, também, à gestão do currículo, ou à orientação da acção educativa da escola, como se diz no artigo 44º do Decreto-Lei nº 553/80, de 21 de Novembro, o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo.
Por isso, ficarei por aqui, na abordagem ao significado da expressão autonomia escolar.
Foquemos agora a nossa atenção sobre a segunda questão que propus: Autonomia porquê? E mantenhamo-nos no caminho que escolhi olhando o que nos diz João Formosinho.
Esta asserção da autonomia da escola é suportada pela emergência do local (designadamente da cidade) como locus de coordenação das políticas sociais e educativas e é legitimada pelo fracasso das inovações baseadas
Este professor da Universidade do Minho acrescenta outros argumentos mais adiante, para nos ajudar a entender esta tendência de autonomia crescente das escolas, observada em toda a Europa, desde os anos 80:
- A progressiva inaptidão do sistema centralizado para gerir a complexidade e heterogeneidade da escola de massas;
- A necessidade de “repartir” as responsabilidades pela crise da educação;
- A emergência do municipalismo em Portugal.
Se olharmos agora, do novo, o documento do GEPE relativo à situação em 30 países da Rede Eurydice, podemos recolher os seguintes argumentos:
- Apenas dois países sobressaem pelas suas tradições altamente desenvolvidas em matéria de autonomia das escolas – a Bélgica e os Países Baixos. Em ambos os casos, esta tradição decorreu das “guerras escolares” entre o ensino público e o ensino privado.
Mais adiante o documento refere, ainda, que nestes países a autonomia das escolas se desenvolveu enquanto reflexo da liberdade de ensino e foi legitimada por considerações de ordem religiosa e filosófica. No século XIX e ao longo da maior parte do século XX, foi sobretudo nessa base que se discutiu.
E acrescenta:
Nos anos 80, o processo tomou outro rumo. As reformas em matéria de autonomia das escolas estavam relacionadas com a causa política da participação democrática.
Lendo o que consta do preâmbulo ao Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de Maio, que aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, vemos que a participação democrática está presente, também, no princípio geral que sustenta esta política em Portugal:
A autonomia das escolas e a descentralização constituem aspectos fundamentais de uma organização da Educação, com o objectivo de concretizar na vida da escola a democratização, a igualdade de oportunidades e a qualidade do serviço público de educação.
A alteração introduzida recentemente no quadro legal, através do DL 771/2007, que passou a regular a autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, traz interessantes modificações que gostaria de trazer à nossa reflexão. O preâmbulo, de novo, apresenta importantes objectivos desta legislação:
- Em primeiro lugar trata-se de reforçar a participação das famílias e das comunidades na direcção estratégica dos estabelecimentos de ensino.
E o Artigo 11º (Conselho Geral) é ainda mais esclarecedor do sentido da transformação:
“O funcionamento dos estabelecimentos de educação e ensino, nos diferentes níveis, orienta-se por uma perspectiva de integração comunitária”.
O que significa esta expressão?
Que implicações tem na governança da escola?
Que relação tem com a autonomia?
Gostaria que significasse a adopção da ideia de “school learning community”, que Jolie Epstein e colaboradores têm vindo a cultivar e expandir nos EUA, a partir da Universidade de John Hopkins.
Aquelas investigadoras defendem esta ideia em alternativa à noção de escola como “professional learning community”.
Uma transformação profunda a aplicação do DL 771 implica é esta mudança de “professional learning community” para “school learning community”.
Aquelas autoras recomendam um programa organizado de parcerias entre escola, famílias e comunidades, que contemple actividades ligadas aos fins de escola, argumentando que …tais programas melhoram as escolas, fortalecem as famílias, dão vigor ao apoio da comunidade, melhoram os resultados e aumentam o sucesso dos alunos.
Ora um tal programa irá tanto mais longe na busca da meta de servir o bem dos alunos, a escola e os seus fins, quanto mais autónoma for a escola. E esta é uma excelente deixa para entramos na reflexão em torno da última questão que levantei:
Autonomia da escola para quê?
Encontrámos já algumas pistas para buscarmos respostas:
- Para assegurar melhores condições à realização da liberdade de ensino;
- Para assegurar melhores condições para a participação democrática;
- Para proporcionar melhor administração e gestão;
- Para melhorar o serviço público que a escola presta.
Gostaria, em todo o caso, de pôr à consideração dos presentes, para o debate que justificou este encontro, dois objectivos primordiais para a autonomia da escola:
- A melhor realização dos seus fins;
- A realização de tais fins através de uma ideia de escola como comunidade educativa e de aprendizagem.
Em qualquer circunstância, mais autonomia requer transparência, garantia de qualidade e prestação de contas, por parte de todas as partes envolvidas, Estas são as minhas muito modestas pistas para o debate que desejam, que é bem oportuno ser estimulado em todo o País.
Porto, 17 de Fevereiro de 2009
Prof. António Câmara - Palestra
Agradecemos à Zona TV
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